A soja emergiu como a cultura âncora da transformação agrícola brasileira no período de 1990 a 2000. Seu cultivo, que antes se concentrava na Região Sul, expandiu-se agressivamente para o Centro-Oeste, em uma das maiores façanhas de ocupação agrícola tropical já vistas no mundo. Esta expansão foi o epicentro de uma revolução tecnológica e logística.

Antes desta consolidação, o Cerrado era considerado um bioma marginal para a agricultura intensiva. Seus solos eram ácidos, pobres em nutrientes e com alto teor de alumínio tóxico. A pecuária extensiva de baixa produtividade era a principal atividade econômica. A ideia de transformá-lo no celeiro do mundo era vista com ceticismo.

A virada veio com um pacote tecnológico desenvolvido principalmente pela Embrapa. A correção do solo com calcário em grandes quantidades para neutralizar a acidez e a adubação fosfatada pesada tornaram o Cerrado fértil. O desenvolvimento de variedades de soja adaptadas ao clima tropical, com ciclos fotoperiódicos adequados, foi o elemento final que destravou o potencial da região.

A comparação entre o início e o fim do período é dramática. Em 1990, o Centro-Oeste produzia uma fração insignificante da soja nacional. Em 2000, já rivalizava com o Sul e se estabelecia como a nova fronteira agrícola. Cidades como Sorriso (MT) e Lucas do Rio Verde (MT) surgiram do zero ou se transformaram em potências agroindustriais.

Esta expansão demandou uma colossal adaptação logística. Estradas de terra foram asfaltadas, ferrovias começaram a ser planejadas e terminais portuários no Arco Norte, como Itaqui (MA) e Santarém (PA), ganharam importância para escoar a produção, reduzindo a dependência dos portos do Sudeste.

O modelo de produção que se consolidou no Cerrado era, desde seu início, de grande escala e altamente tecnificado. Isso diferia da agricultura familiar do Sul, impulsionando a formação de grandes propriedades e a profissionalização da gestão rural. O agricultor assumiu o papel de empresário do agronegócio.

A soja não apenas transformou a economia do Centro-Oste, mas também impulsionou uma cadeia de valor. A produção de frangos e suínos na região Sul e Sudeste se beneficiou da oferta interna abundante de farelo de soja para ração, fortalecendo a proteína animal brasileira no mercado externo.

Dessa forma, a revolução da soja no Cerrado, concluída essencialmente nesta década, foi o evento singular mais importante para posicionar o Brasil como uma potência agrícola. Foi a materialização bem-sucedida de décadas de pesquisa, coragem de produtores e investimento em infraestrutura, criando um novo paradigma de produção tropical.